sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Lembranças do Corpo

Irene Ziviane

De 08 a 12 de outubro

1- Sempre me emociono com jeito pelo qual os lobos batem nos corpos uns dos outros quando correm e brincam, os mais velhos a seu modo, os jovens ao deles, os magros, os gordos, os de pernas longas, os de rabo cortado, os de orelha caídas, os de membros quebrados que ficaram tortos ao sarar. Todos tem sua própria configuração corporal, sua própria força e sua própria beleza. Vivem e brincam de acordo com o que são, quem são e como são. Eles não tentam ser o que não são.

2 - Bem ao norte, vi uma velha loba com três pernas. Ela era a única que conseguia se enfiar numa fenda na qual cresciam vacínios. Outra vez vi um lobo cinzento armar o bote e saltar com tal velocidade que deixou no ar por um segundo a imagem de arco prateado. Lembro-me de uma visão delicada, a de uma jovem mãe, ainda redonda de corpo, procurando com cuidado o caminho entre o musgo do lago com a graça de uma bailarina.

3- No entanto, apesar de sua beleza e sua capacidade de manter a força, as vezes falam dos lobos nos seguintes termos "Ah, vocês têm fome demais; seus dentes são afiados demais; seus apetites são muitos interesseiros". À semelhança dos lobos, as pessoas às vezes encaram os indivíduos como se apenas um determinado tipo de temperamento, de apetite, fosse aceitável. E com enorme frequência acrescenta-se a essa atitude a atribuição de correção ou incorreção moral de acordo com a conformidade da forma, do jeito de andar, da altura, e do tamanho da pessoa em relação a um ideal único exclusivo.

4- Quando as pessoas são relegadas a disposições de ânimo, a maneirismo e a contornos que se amoldam a u único ideal de beleza e de comportamento, elas se tornam cativas tanto no corpo quanto na alma, não gozando mais de liberdade.

5 - Na psique institiva, o corpo é considerado um sensor, uma rede de informações, um mensageiro com uma infinidade de sistemas de comunicação - cardiovascular, respiratório, ósseo, nervoso, vegetativo, bem como o emocional eo intuitivo. No mundo imaginário, o corpo é um veículo poderoso, um espírito que vive conosco, uma oração de vida nos seus próprios méritos.

6- Nos contos de fadas, como encarnado por objetos mágicos que têm capacidades e qualidade sobre-humanas, considera-se que o corpo tem dois pares de orelhas, um para ouvir os sons do mundo, o outro para ouvir a alma; dois pares de olhos, um para a visão normal, o outro para vidência; dois tipos de força, a dor dos músculos e a invencível força da alma. A lista de pares relacionados ao corpo não pára por aí.

7- Em métodos de trabalho com o corpo como de Feldenkrais, de Aruyvede e outros, entende-se, de diversas perspectivas, que o corpo possui seis sentidos, em vez de cinco. O corpo usa sua pele, sua fáscia e sua carne mais profunda para registar tudo que ocorre com ele.

8- Como a pedra de Roseta, para aqueles que sabem decifrá-lo, o corpo é um rgistro vivo de vida transmitida, de vida levada, de esperança de vida e de cura. Seu valor está na capacidade expressiva para registrar reações imediatas, para Ter sentimentos profundos, para presentir.

9-O corpo é um ser multilíngue. Ele fala através da cor e de temperatura, do rubor do reconhecimento, do brilho do amor, das cinzas da dor, do calor da excitação, da frieza da falta de convicção. Ele fala através do seu bailado infimo e constante, ás vezes oscilante, às vezes agitado, às vezes trêmulo. Ele fala com o salto do coração, a queda do ânimo, o vazio no centro e com a esperança que cresce.

10- O corpo se lembra, os ossos se lembram, as articulações se lembram. Até mesmo o dedo mínimo se lembra. A memória se aloja em imagens e sensações nas próprias células. Como uma esponja cheia de água, em qualquer lugar que a carne seja pressionada, torcida ou mesmo tocada com leveza, pode jorrar dali uma recordação.

11 - Limitar a beleza e o valor do corpo a qualquer coisa a essa magnificiência é forçar o corpo a viver sem seu espírito de direito, sem sua forma legítima, seu direito ao regozijo. Ser considerado feia ou inaceitável porque nossa beleza está fora de moda atual fere profundamente a alegria natural que pertence à natureza selvagem.

12- É claro que a natureza institiva das pessoas valoriza o corpo e o espírito muito mais por capacidade de vitalidade, sensibildade e resistência do que por qualquer avaliação de aparência. Esse ponto de vista não pretende descartar aquilo que seja belo por qualquer segmento de cultura, mas sim, traçar um círculo mais amplo que inclua todas as formas de beleza, forma e função.

13- Feldenkrais nos ensina a amar o corpo. Depois de aprender como tratá-lo com atenção, delizadeza e cuidado, e de obter uma resposta fácil e clara pelo que fazemos ao nosso corpo, descobrimos que aprendemos a amar o que está dentro dele: nós mesmos.

14- Prestando atenção ao movimentos mais corriqueiros, já se pode começar a redestribuir tensões. Modificando hábitos e reeducando os gestos cotidianos, pode-se conquistar o prazer de ser dono do próprio corpo.

15- Para compreender o movimento em nosso corpo, é preciso sentir e não forçar.Às vezes despendemos muita energia simplesmente porque estamos habituados a um esforço além do que a situação pede. Ao executarmos nossos movimentos, pecisamos despertar a capacidade latente de dosar a própria força, de afiná-la, de educar afaculdade de discernimento efazer uso da tensão oportuna.

16- A memória gosta de lembrar o corpo inteiro: não é do rosto dos nossos pais que nos lembramos, mas de seus corpos e atitudes nas suas cadeiras prediletas, comendo, fumando, em todas as pequenas ações do cotidiano. Nós nos lembramos das pessoas como corpos em movimento e não como rostos estáticos



Galera de música e teatro plantando árvores na usina.



Um comentário:

Rachel Dourado disse...

Eu sabia que tinha uma lado "deformado" o lado direito, sou esquerda sempre.
beijos
Saudades da Irene